Reza a história que no meio duma tempestade, um grupo de marinheiros prometeu construir uma ermida no cimo dum monte, dedicada à Virgem Santíssima, caso o navio não embatesse nos rochedos da costa. E assim, para cumprir a promessa, foi construída no século XVII, no Monte Gordo, no Caniçal, a Capela de Nossa Senhora da Piedade.
Nossa Senhora da Piedade tornou-se a Santa protetora dos pescadores da vila do Caniçal e em sua honra é realizada a Festa da Nossa Senhora da Piedade, no terceiro fim de semana de setembro de cada ano. Este ritual católico, que acontece quer chova quer faça sol, é uma forma dos pescadores agradecerem a pesca do ano e o regresso à terra.
Esta festa inclui uma procissão que se diferencia das outras procissões que decorrem na Ilha da Madeira, na medida em que também decorre no mar. Todos os anos se realiza um sorteio para escolher o barco que irá levar a imagem da Nossa Senhora da Piedade, que é uma réplica da famosa escultura Pietà, de Miguel Ângelo, e que representa a dor de Maria sobre o corpo morto do seu filho. A dor desta mãe espelha a dor das mães que vêem os seus filhos embarcando nos barcos sem nenhuma certeza de que ao final do dia irão regressar do mar.
A Festa da Nossa Senhora da Piedade começa no sábado. A Imagem da Nossa Senhora encontra-se na capela, no Monte Gordo, onde é ornamentada com o ouro oferecido pelos fiéis e colocada num andor, que é transportado por homens até ao barco. O andor segue no barco sorteado para o efeito, e desembarca na povoação para que a imagem continue a procissão até à Igreja Matriz, sempre acompanhada com os hinos tradicionais. Chegando à Igreja Matriz é realizada uma missa.
No domingo, a procissão prossegue, mas fazendo o percurso inverso, de forma a devolver a imagem à capela. A subida para a capela é também uma representação da subida de Jesus ao Monte Calvário e os fiéis que fizeram promessas percorrem o trajeto enquanto os outros ficam nos barcos.
Mas um ritual deste género envolve sempre convívio e diversão, e por isso, os arraiais decorrem no mar e em terra. São algumas dezenas de embarcações e a esta festa juntam-se habitantes de toda a ilha. Durante todo o ano os pescadores colocam de parte dinheiro para financiar este fim de semana de festa. Oferecem comida, bebida e muita animação a quem está nas suas embarcações decoradas e pintadas com cores alegres.
E novamente o sagrado e o profano se encontram e convivem respeitosamente entre si, num fim de semana de muita fé e alegria. Uma festa, na qual podemos ver a devoção de muitos madeirenses, especialmente daqueles que fazem do mar o seu local de trabalho. Um mar, cuja força se sobrepõe à força do homem. Um mar que suscita grande respeito e a invocação de forças que são invisíveis aos nossos olhos.
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